quinta-feira, 31 de agosto de 2023

‘O médico mandou eu viver com a Lorena um dia de cada vez’, diz mãe de criança de 7 anos na fila do transplante de coração

‘O médico mandou eu viver com a Lorena um dia de cada vez’, diz mãe de criança de 7 anos na fila do transplante de coração

Bárbara Stefani estava grávida quando descobriu que a menina tinha uma cardiopatia congênita rara; filha hoje tem 7 anos de idade


Bárbara Stefani, 31 anos, estava grávida de Lorena quando descobriu que a filha era portadora de uma cardiopatia congênita rara e agressiva. O problema fazia um dos músculos do coração do feto bater de forma mais lenta do que o normal. E foi também durante a gestação que ela soube que a única solução com passar do tempo seria a filha entrar na lista de transplante de coração.


Quatro anos se passaram desde a chegada na fila e ela ainda não foi transplantada. O cenário com crianças é diferente, as cirurgias mais escassas. Assim como a menina, o Brasil hoje tem 64 meninas e meninos com até 17 anos de idade à espera de um coração, de acordo com o Sistema Nacional de Transplantes, atualizado nesta terça-feira. O total de pessoas, para se ter uma ideia, é de 380.


— O médico mandou eu viver com a Lorena um dia de cada vez. E é isso que eu tento fazer desde então — diz a mãe.


A seguir, o relato de Bárbara:


Estava na gestação quando, durante um ultrassom, descobri que a Lorena tinha uma cardiopatia congênita grave e rara. Soube também naquele momento que a solução seria um transplante de coração quando crescesse um pouquinho. Tive de sair de Alagoas para ter o parto em São Paulo pela complexidade da situação.


Ela saiu da minha barriga direto para a internação. Foram 6 meses no hospital. Quando ela tinha sete meses de vida, recebeu alta e conseguimos voltar para nossa cidade, mas tinha de ir para São Paulo a cada 3 meses para exames. Quando ela completou 3 anos chegou o momento de entrar na fila do transplante. Não tinha mais o que ser feito. Lorena estava tomando mais de 12 remédios diários com doses altíssimas, e a única alternativa era um novo órgão.


Já se passaram 4 anos na fila de espera. No começo, confesso que fiquei angustiada. Eu não estava pronta para aquilo. Fiquei com muito medo. De lá para cá enfrentamos uma batalha, com 40 internações. Quando minha filha ficava mal, ela sentia tontura, falta de ar, ficava extremamente pálida, lábios e pontas dos dedos roxos, suando frio e desmaiada. Eu a pegava nos meus braços e parecia uma criança morta.


Ela dava entrada no hospital como prioridade na fila, mas nunca chegava um coração. Então ela se recuperava e recebia alta. Hoje, vive uma vida estável. Consigo mandá-la para a escola e sair com ela. Vive como uma criança praticamente normal, claro que tem seus cuidados, os medicamentos que precisa tomar, os exames e consultas, mas eu consigo tê-la em casa e isso me acalma um pouco. Na escola, deixo todo mundo consciente do caso e limitações. Há pouco começou a ter educação física. Questionei a médica se ela poderia participar e ela autorizou desde que a turma e os professores respeitassem o tempo dela. Se ela estiver correndo e sentir cansaço, ela deve parar imediatamente, descansar e depois quando sentir que tem fôlego e quiser voltar, ela pode.



A Lorena tem consciência total da condição dela. É muito responsável. A preparo para essa cirurgia há 4 anos. Falo que ela vai precisar tomar anestesia, que eles vão abrir o peitinho dela, mas que vai estar dormindo e que vai acordar depois de ter acabado tudo. Lorena é uma criança que não reage com medo, ela é uma criança muito confiante. Não deixo de falar que pode dar errado, mas sempre enalteço a confiança e o pensamento positivo. Falo que vai dar tudo certo, que eu estou do lado dela e nós somos uma família de muita fé. Apesar de tudo, vai dar certo. Aconteça o que acontecer, eu vou estar lá com ela, a recuperação vai ser rápida e logo, logo, ela estará em casa.


Em relação a mim, há dias que me rastejo. Simplesmente não suporto mais, porém, me lembro que eu tenho uma filha que precisa e depende de mim. E então me levanto. Peço pra Deus me dar forças para continuar e vou caminhando.


Me lembro de uma das primeiras conversas que tive com um médico, quando ela tinha três anos. Ele disse todas as verdades que uma mãe precisa ouvir. Disse que eu ia abdicar de toda uma vida para cuidar da Lorena, mas que não era para ela ser tratada como uma criança especial. Nem por mim ou por outras pessoas. Ela é uma criança cardiopata que tem um coração especial e que está sendo tratado. Ele mandou eu viver com a Lorena um dia de cada vez e é isso que eu tento fazer desde então. Independente das internações e de todo o processo. Tenho minhas angústias, tem dias que estou pra baixo e parece que nunca vai chegar a nossa vez, mas se estiver frio e ela quer tomar sorvete, nós vamos. Se ela quer passear no shopping, ou ir ao cinema, nós vamos. Estou sempre passando o meu tempo com ela e vivendo aquele momento.


Ele quis dizer, e é verdade, é que os cardiopatas são como uma bomba-relógio. Uma hora ela está super bem e em outro ela acorda como se estivesse morta em meus braços. Eles podem explodir a qualquer momento. Eu entendi que ele falou para eu viver o hoje, porque amanhã posso não ter mais ela.

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